A maior parte dos donos de negócios se baseia nas próprias necessidades e gostos pessoais na hora de decidir com o que empreender. Com o oceanógrafo Marcelo Ubarana, de 31 anos, não foi diferente. Para ele, estava em jogo a saúde e a felicidade de Godofredo, um cachorro da raça sharpei.

 

 

Em 2014, Godô chegou à casa de Ubarana na cidade paulista de Taubaté. Antes de receber o novo integrante da família, o empreendedor decidiu estudar um pouco sobre as características da raça e descobriu algumas particularidades, como uma expectativa de vida relativamente baixa (entre 8 e 10 anos) e a tendência a desenvolver doenças de pele, por conta das dobrinhas.

 

“Quando peguei meu cachorro, comecei a pesquisar formas de aumentar a longevidade dele. Descobri que a alimentação natural ajudaria a evitar esse tipo de problema de pele e aumentar a expectativa de vida”, diz Ubarana.

 

Essa informação causou um conflito no dono do Godô. Ele sabia que o melhor seria não alimentar o animal com ração industrializada, mas não entendia exatamente o que poderia dar de comida ao cão. Quem ajudou nessa tarefa foi Lucas Rodrigues, um amigo de infância e médico veterinário especialista em oncologia.

 

Juntos, os amigos bolaram algumas receitas de comidas naturais e saudáveis para Godô. “Ele adorou a ideia. A palatabilidade é outra, não tem como comparar”, diz o empresário, que dava os seus primeiros passos para a criação da Fresh4Pet, uma marca de comida natural para cães.

 

Na época, Ubarana trabalhava em uma consultoria de assuntos portuários, mas pouco tempo depois saiu para gerenciar o restaurante do irmão, na capital paulista. Após dois anos acumulando experiências como empreendedor, ele decidiu que era hora de levar uma vida de dono e dar início ao próprio negócio: “Por que não vender comidas naturais como as que faço para o Godô?”

 

O negócio de comida para cachorro

 

Para entender um pouco desse mercado pet, que movimenta mais de R$ 20,3 bilhões por ano, de acordo com dados da Associação Brasileira da Indústria de Produtos para Animais de Estimação (Abinpet), Ubarana recorreu, novamente, ao amigo Rodrigues. O veterinário estava fazendo um pós-doutorado nos Estados Unidos e notou que a ideia de alimentar os cachorros de forma mais natural estava ficando forte tanto entre os americanos como entre os europeus. Abrir um negócio do tipo no Brasil parecia uma ótima opção.

 

“Ele me disse que esse tipo de comida realmente é mais saudável e aumenta a longevidade do cachorro. No Brasil, o mercado ainda está engatinhando”, afirma Ubarana”. “Mas eu enxerguei uma oportunidade.”

 

 

Embalagens Fresh4Pet - Alimentação Natural

 

Para testar o produto, o empreendedor perguntou às pessoas próximas se gostariam de levar aos seus cães essa nova forma de alimentação. Todos responderam que a experiência havia sido positiva.

 

O feedback positivo estimulou os amigos a começarem a empresa: Ubarana cuidaria do plano de negócios, do estudo de mercado, das burocracias e das demais decisões práticas para tirar o projeto do papel. Já Rodrigues ficaria responsável por desenvolver receitas saudáveis que atendessem as diferentes necessidades dos “consumidores”. A empresa de comida natural para cachorros seria batizada de Fresh4Pet.

 

Os irmãos de Ubarana, um especialista em finanças e um chefe de cozinha ajudaram o empreendedor a planejar a nova empresa e pegar o jeito da administração. Além disso, ele adquiriu conhecimento com um MBA em gestão estratégica de negócios e economia empresarial na Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe).

 

Os desafios de abrir uma empresa de comida para cachorro

 

 

Todo esse preparo do empreendedor não foi suficiente para agilizar a abertura do negócio. Diferentemente da legislação para comida humana, qualquer tipo de produção de comida animal se enquadra no conceito de indústria, mesmo que seja algo pequeno. Isso significa que, para fazer e comercializar esses alimentos, é preciso seguir as mesmas regras de uma grande fábrica, como a Pedigree.

 

Antes de pedir licenças e autorizações, era preciso alugar um imóvel em uma zona industrial, onde funcionaria a cozinha da Fresh4Pet. Como os espaços em Taubaté eram muito grandes e muito caros, a saída encontrada por Ubarana foi mudar de cidade. O local escolhido foi Pindamonhangaba, que fica a 20 minutos de distância.

 

“Eu sabia que não seria fácil abrir a empresa, mas achei que ia demorar um ano, no máximo. No fim, foram cerca de 18 meses para conseguir tirar todas as licenças, pagando aluguel e sem poder produzir”, diz o sócio-fundador da Fresh4Pet.

 

O alvará dos Bombeiros, da Prefeitura e do Conselho Regional de Medicina Veterinária não foram difíceis de conseguir. Já a licença da Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (Cetesb) e do Ministério da Agricultura demoraram mais de um ano para sair. Com muita burocracia envolvida, Ubarana ainda teve de gastar dinheiro com duas consultorias especializadas para conseguir as autorizações.

 

“Era um efeito dominó: para conseguir a licença da Cetesb, eu precisava do alvará da Prefeitura; para conseguir o da Prefeitura, precisava do dos Bombeiros. O último deles foi a licença do Ministério da Agricultura”, afirma ele.

 

O empreendedor de Taubaté tinha uma poupança, capital necessário para investir no próprio negócio. O problema foi que, com tanta demora, o dinheiro acabou e a situação financeira foi ficando cada vez mais difícil. Ubarana pensou em desistir do sonho de abrir a Fresh4Pet, mas recebeu força da família e da noiva, Andreia, que estiveram sempre ao lado dele. Com esse respaldo, o empreendedor conseguiu ser resiliente até o fim – ao todo, ele gastou R$ 100 mil.

 

“O mais caro não são as licenças, e sim ficar sem produzir. Arcar com as despesas, aluguel, luz, IPTU sem faturar. As pessoas em volta de mim me falavam para não desistir porque tinha um negócio bom nas mãos. Isso que me deu força”, diz Ubarana. 


O diferencial da comida para cachorros

 

Vencidos todos os obstáculos, a Fresh4Pet foi inaugurada em novembro de 2018. Atualmente, ela é a única empresa de comida natural para cães do Vale do Paraíba e uma das poucas regularizadas do Brasil. O alimento é congelado e embalado a vácuo sempre em porções diárias e na quantidade correta para cada tipo de cachorro. O cálculo é feito pelo próprio site da Fresh4Pet e leva em consideração a raça, o peso, a idade e se o bichinho é ou não castrado.

 

 

Alimentação Natural para Cães Adultos

 

Os clientes podem pedir a comida de duas formas: em compras avulsas, feitas pelo Instagram e pelo site, ou por assinaturas mensais. Quem decide ser assinante faz o pagamento por boleto todo mês e recebe as porções a cada 15 dias. Se for necessário, as entregas também podem ser semanais. Não há qualquer tipo de contrato ou multa para assinantes que não querem mais comprar as refeições.

 

“A pessoa é livre para parar de comprar a qualquer momento, mas ninguém costuma parar. As pessoas com quem testei meu produto lá em 2016 ainda estão comigo, comprando todos os meses”, diz o empreendedor.

 

Buscando atender diferentes necessidades dos cachorros e evitar que eles rejeitem o alimento, Rodrigues e Ubarana bolaram 7 receitas diferentes que seguem 3 linhas: uma para filhotes, 4 para adultos e duas para cães com necessidades especiais (obesos e idosos). Todas as receitas incluem algum tipo de proteína, que pode ser carne de frango, cordeiro, vaca ou porco, além de legumes e verduras, como grão de bico, batata doce, inhame, mandioquinha, salsa e cenoura. A mais vendida é a comida com frango.

 

Para aflorar o gosto dos alimentos e conquistar ainda mais os clientes finais da Fresh4Pet, são acrescentados alguns temperos que podem ser consumidos em pequenas quantidades pelos cachorros, incluindo cúrcuma, também conhecida como açafrão, e o sal do himalaia. Os empresários finalizam as receitas com suplementos vitamínicos e minerais, também em quantidade ideal para cada cão.

 

As dietas especiais para idosos e obesos, por outro lado, têm quantidades diferentes de ingredientes. Quando o cachorro precisa emagrecer, por exemplo, a recomendação é uma alimentação com menos carboidratos e mais proteína. Já os idosos precisam de uma dose específica de suplementos vitamínicos. O mesmo vale para a comida dos filhotes, que deve repor o gasto energético e fornecer nutrientes que ajudem no crescimento.

 

“Para toda receita, criamos um método de produção. Assim, ela fica padronizada. É tudo pesado: a quantidade de frango é sempre a mesma, a de carne também. Eu passo a receita para os meus funcionários e eles fazem”, afirma o empreendedor.

 

Um negócio em expansão

 

Hoje, Ubarana tem 5 funcionários – 3 trabalhando na cozinha e 2 ajudando na administração. Ele se dedica em tempo integral ao seu negócio, cuida da gestão financeira, faz compras, paga fornecedores e resolve todas as outras pendências da rotina do negócio. O sócio Rodrigues não está sempre na empresa, mas acompanha todo o andamento do empreendimento.

 

A Fresh4Pet começou as atividades, em novembro, com apenas 5 clientes fixos. Hoje, são 50 assinaturas e, em média, 50 pedidos avulsos por mês. O preço do quilo de comida para quem faz uma assinatura varia entre R$ 20 R$ 24. Já o preço para o quilo avulso é de R$ 30. A média de pedidos dos clientes é de 10 quilos por mês. Aqueles que compram altos volumes ganham descontos especiais.

 

A maioria dos clientes da Fresh4Pet está na cidade de São Paulo e de São José dos Campos (SP). Para facilitar a logística, os empresários alugaram um freezer na capital e fecharam parceria com dois hospitais veterinários de São José dos Campos, que se tornaram pontos de venda. A entrega em São Paulo é feita pela Log.

 

O cachorro Godofredo, que inspirou a Fresh4Pet, hoje ajuda na propaganda. No meio dessa história, a noiva de Ubarana criou uma conta no Instagram para postar fotos do animal de estimação. A página cresceu e hoje tem quase 9 mil seguidores. Com tanto sucesso, os empresários usam tanto o Insta do Godô (@godo_sharpei) quanto da Fresh4Pet (@fresh4pet) para impulsionar posts e stories. A maior venda vem daí.

 

Quando questionado sobre os sonhos de empreendedor, Ubarana diz que quer produzir 2 toneladas de comida natural para cachorros até o fim de 2019. Em quatro meses de empresa, foi produzida quase 1 tonelada. Para atingir a meta, o empreendedor pretende captar R$ 200 mil em investimentos, comprar mais maquinário e aumentar as estratégias de marketing.

 

“Eu gostaria de ajudar outras startups, ser investidor anjo. Eu fui ficando com essa vontade ao longo do meu processo de abertura, que foi muito difícil. Preciso de um tempo para fazer a minha empresa dar certo e depois ajudar outros empreendedores”, diz o dono do Godô, que sabe que a principal lição que tem para dividir é a resiliência de acreditar que a sua ideia pode dar certo.

 


Fonte: Azullis